José Márcio Soares Leite
Realizou-se em São Luís, nos dias 7 e 8 deste mês, o III Congresso Maranhense
de Medicina, cujo enfoque maior foi para as ações de saúde desenvolvidas na atenção
básica (AB) ou atenção primária à saúde (APS). Esta é considerada a mais complexa
das ações de saúde, não em densidade tecnológica, mas por envolver não somente a área
da saúde, como também os campos da antropologia, da cultura, da educação, da
sociologia e da epidemiologia, no dia a dia da prática em saúde nos povoados, nos
bairros, nos municípios e nas metrópoles.
Estes Congressos tem tido como objetivo fomentar o intercâmbio científico e a
troca de experiências entre os profissionais e estudantes da área da saúde e afins, das
diversas Regiões de Saúde do Estado e mesmo de outros Estados, além da promover a
atualização sobre temas como saúde materno-infantil, saúde mental, doenças
transmissíveis, saneamento básico, educação em saúde e as doenças crônicas não
transmissíveis.
Em seu mais recente livro, As Redes de Atenção à Saúde, o professor Eugênio
Vilaça Mendes, consultor da Organização Panamericana da Saúde (OPAS), descreve
com muita propriedade a situação de saúde decorrente do que ele denomina a tripla
carga de doenças existente no Brasil, que compreende: 1º- o grupo de doenças
infecciosas, parasitárias, a desnutrição, as doenças de origem materno/perinatal; 2º- as
decorrentes dos acidentes e de violências; 3º- as doenças crônicas não transmissíveis,
como: doenças cardiovasculares, respiratórias, renais, endócrinas, reumatológicas,
pulmonares, com maior incidência do diabetes, da hipertensão, dos acidentes vasculares
cerebrais e o câncer, que já respondem por 66,3%, da morbidade geral no Brasil.
Eis a razão pela qual deve haver uma coerência entre a situação de saúde da
população, expressa, especialmente, pelas situações demográficas e epidemiológicas; e
a organização dos sistemas de saúde.
Os municípios, que representam a célula mater do SUS, segundo o que está disposto na Constituição Federal, precisam urgentemente de mais recursos para a saúde, de forma que possam desenvolver as ações básicas em saúde e articular-se com os municípios maiores de sua região ou macrorregião de saúde, garantindo uma resolubilidade integral aos seus munícipes e conformando o que denominamos de regionalização solidária.
Na realidade de hoje, contudo, existe um verdadeiro bloqueio na continuidade do atendimento feito na atenção primária, ou seja, quando o usuário precisa fazer exames de apoio diagnóstico, consultas especializadas ou internações clínico-cirúrgicas.
O Governo do Maranhão, para enfrentar essa grave situação de bloqueio na atenção à saúde, cuidou de construir, reformar e equipar, por meio do Programa Saúde é Vida, da Secretaria de Estado da Saúde, e com recursos próprios do Tesouro do Estado, 69 Hospitais de Pequeno Porte, nos municípios que não dispunham de 1 leito sequer, Hospitais Gerais Regionais de média complexidade, nas 19 Regiões de Saúde do Estado, Hospitais Macrorregionais de alta complexidade, além de quadriplicar os leitos de UTI existentes.
Assim, de forma descentralizada e regionalizada, está sendo redesenhado o modelo de atenção à saúde do Maranhão, garantindo a retaguarda dos atendimentos prestados pelos municípios, constituindo uma rede única de atenção à saúde (RAS), articulada, integrada e regulada.
O Sistema Único de Saúde (SUS), o maior sistema médico-social do mundo e que completa este ano 26 anos, tem ainda muitos óbices, muitos desafios a serem enfrentados, entre estes uma política de recursos humanos e o seu financiamento. O Maranhão, por exemplo, tem um dos menores percapitas/SUS do país. Durante o Congresso, esses e outros entraves ao avanço do SUS foram exaustivamente debatidos e analisados, mas sempre findando com a propositura de sugestões para seu equacionamento.
Ao concluir-se mais um importante Congresso com os profissionais de saúde, estudantes do campo da saúde, restou evidente o reconhecimento de todos de sua importância para a saúde do Maranhão e do Brasil, valendo, para tanto, reproduzir o depoimento de um dos congressistas: “...este Congresso foi muito importante para se conhecer, debater, sugerir e apontar soluções. Nós que trabalhamos no dia a dia atendendo diretamente os usuários do SUS é que conhecemos suas necessidades e aprendemos com eles a apontar a saúde que o povo quer”.
*Professor Doutor em Ciências da Saúde. Presidente da Academia Maranhense de Medicina. Subsecretário de Estado da Saúde do Maranhão e Presidente do III Congresso Maranhense de Medicina.
Publicado no Jornal O Estado do Maranhão, de domingo 17 de agosto de 2014
quarta-feira, 20 de agosto de 2014
Discurso de posse do Dr. Arquimedes Viegas Vale, em 31 de janeiro de 2014.
Senhor
Presidente da Academia Maranhense de Medicina, Prof. Dr. José Marcio Soares
Leite, de quem empresto a dignidade e importância para saudar, prazerosamente,
os demais componentes desta mesa, aos honoráveis membros desta Academia e aos digníssimos
amigos e amigas presentes.
Sinto-me,
deveras emocionado e enaltecido por transpor este magnífico umbral e
hospedar-me neste silogeu para ocupar a Cadeira 31 fundada pelo Dr. José
Ribeiro Quadros e patroneada pelo Dr. Odilon Soares. Juntar a humildade do meu
nome a tão significativas expressões da medicina do Maranhão me unge em honra e
me exige responsabilidade e respeito, para manutenção desta sequencia acadêmica
iluminada por Esculápio.
O Dr. José
Ribeiro Quadros nasceu na cidade de Codó, no Maranhão, em 1º de novembro de
1927, filho de Nazeu Saldanha Quadros e Neide Ribeiro Quadros.
Formou-se em
medicina na Faculdade de Ciências Médicas de Recife – Pernambuco. Foi acadêmico
interno do Sanatório Otávio de Freitas, também em Recife, no período de 1950 a
1952 e no Hospital Sanatório Santa Maria
no Rio de Janeiro em 1953.
Especializou-se
em Tisiologia e desempenhou a sua profissão com grande empenho e dedicação
tornando-se referência no tratamento de doenças respiratórias, em nosso Estado.
Recebeu vários prêmios e fez vários cursos de atualização. Frequentou o serviço
de endoscopia respiratória no Hospital Cochin de Paris, uma extensão da
Faculdade Medicina de Paris e fez curso de extensão no Instituto Principe de
Piemont “Professor Monaldi”, em Nápoles, na época um dos mais conceituados
sanatórios em tisiologia, da Itália. Participou do Congresso da Associação
Calabresi Contra a Tuberculose na Itália, apresentando um trabalho sobre a
profilaxia da tuberculose no Brasil.
Aqui em São
Luís teve um grande desempenho na medicina. Atuava na clínica particular, com
uma grande e fiel clientela; foi Diretor do Sanatório Getúlio Vargas; chefe do
Serviço de Pneumologia e Tisiologia do Hospital Presidente Dutra, médico do
Serviço de Pronto Socorro da Superintendência Médica do antigo IAPC. Assumiu a
Secretaria de Saúde do Estado no período de 1963 a 1966. Foi fundador da
Faculdade de Medicina do Maranhão e professor da disciplina de Pneumologia e
Tisiologia. Rotariano atuante, em 30 de outubro de 1959, fundou o Rotary Club
de Codó. Foi também acadêmico fundador da Academia Maranhense de Medicina. Faleceu,
nesta cidade no dia 15 de novembro de 2012, deixando uma grande obra de
serviços em prol da saúde e da educação no Maranhão.
O nosso patrono Dr. Odilon da
Silva Soares nasceu em Pinheiro em 1º de janeiro de 1902. Era filho de Tito
Otaviano Duarte Soares, natural de Bacurituba/Ma que em 1889 mudou-se a cidade
de Pinheiro/Ma onde casou-se com Maria
Tereza Silva Soares com a qual iniciou a sua prole. A família mudou-se para São Bento em 1909 e aí Odilon fez o
primário na Escola Mista Estadual, pois já estava alfabetizado pelo seu pai,
que era professor.
Fez o curso ginasial e o
científico no Liceu Maranhense, e iniciou o curso universitário na
Faculdade de Direito de São Luís, em 1920, na qual cursou apenas o 1º ano. Nesse mesmo ano fez concurso para professor
da Escola Técnica do Centro Caixeiral conquistando o primeiro lugar. Em 1922
foi nomeado 3º Escriturário da Secretaria de Fazenda do Estado do Maranhão,
pelo Dr. José Maria Magalhães de Almeida, que posteriormente seria governador
do Estado, e o colocou à disposição facilitando que se transferisse para o Rio
de Janeiro, onde em 1923 fez vestibular e foi aprovado para a Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro. Morava em uma hospedaria de propriedade de um casal
germânico para o qual ensinava português e com ele aprendia alemão. Formou-se
em Medicina em 1928. Especializou-se em obstetrícia, tisiologia, cirurgia geral
e cirurgia torácica.
Defendeu a tese “Contribuição
ao estudo das apófises pterigoides”, publicada em 1929 no Boletim do Museu
Nacional, já que o trabalho foi realizado no laboratório de Antropologia dessa instituição.
Contraiu tuberculose e ao
curar-se instalou o seu consultório em Santa Luzia no Estado de Goiás, e mais
tarde transferiu-se para São Luís, com sua esposa, também médica e
farmacêutica. Aqui nasceu a sua única filha à qual deu o nome de Flávia Maria.
Desempenhou as seguintes
atividades:
Auxiliar técnico da cadeira de
Anatomia da Faculdade de Medicina da Universidade do Rio de Janeiro.
Interno do Hospital da Marinha
por concurso, em primeiro lugar.
Assistente, chefe de cirurgia,
diretor, Vice provedor e Provedor da Santa Casa de Misericórdia.
Cirurgião do Hospital
Português, onde realizou a primeira cirurgia de apendicite supurada.
Fundador e Diretor Técnico da
Liga Maranhense contra a Tuberculose.
Chefe da equipe que realizou a
primeira toracoplastia do norte e nordeste do Brasil, aqui em São Luís.
Introdutor, no norte e nordeste
da técnica do pneumotórax como auxiliar no tratamento da tuberculose.
Como político, foi eleito
Deputado Constituinte em 1946 e da sua lavra foi o projeto que instituiu a
disciplina de Tisiologia nas Faculdades Federais de Medicina e a exigência da
abreugrafia nas carteiras de saúde.
Foi membro da Sociedade de
Medicina e Cirurgia do Maranhão, da Academia Maranhense de Letras ,
cadeira 34, e membro fundador do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão, cadeira 25; membro benemérito da Sociedade Brasileira de
Tuberculose e membro de honra da jornada comemorativa do cinquentenário
de fundação das Ligas contra a Tuberculose. Pertenceu, ainda, ao Fellow American
College Of Chest Physician e colaborador do Jornal de
Pinheiro e da Revista Brasileira de Tuberculose.
Poliglota, falava e escrevia
fluentemente os idiomas alemão, italiano, inglês, francês, espanhol,
latim, com conhecimento do grego. .
Foi fundador da Faculdade de Farmácia e Odontologia,
da Faculdade de Filosofia e lecionou em
todas essas instituições.
Era um intelectual e traduziu para a
língua portuguesa obras de Goethe e para o alemão, poemas de Sousândrade.
Criou de mais de setenta bibliotecas
espalhadas no Maranhão. Em Pinheiro criou a biblioteca Padre Claude D’Abbeville
que deixou sob a responsabilidade da Prelazia e em Alcântara a Biblioteca Tito
Soares.
Trabalhou pela cultura do estado e conseguiu recursos para a construção
da estátua de Humberto de Campos na Capital Federal e para os bustos de
Raimundo Correa e Artur Azevedo para a Praça do Panteon em S. Luís. Em
Alcântara restaurou a fachada da Igreja de Nossa Senhora do Carmo e o
Pelourinho de parceria com seus irmãos.
Faleceu em sua residência, à rua do Passeio nº 124, de um enfarte do
miocárdio fulminante no dia 08 de julho de 1958.
Com muito merecimento hoje e sempre o reverenciamos.
.O
extenso percurso que até aqui me trouxe sempre foi linear com o norte da bússola
apontando para a medicina. Jamais me imaginei em outra condição na minha
relação com objetivos de vida profissional e existência. Deixei o amparo e o
carinho da casa dos meus pais, partindo do meu chão bento, ali pertinho, na
baixada maranhense, trazendo emoções divididas: a saudade do que ficava e a
esperança do que buscava.
Aqui cheguei,
nesta acolhedora cidade, há cerca de cinquenta anos, quando o bucolismo ainda se
espalhava pelas ruas e praças e a cordialidade se sentava nas cadeiras das
calçadas ao cair da tarde. A minha
esteira do tempo, agora estendida sobre pedras de cantaria, ladeiras e sobrados
tinha um traçado incógnito, mas como meta a construção de um ponto no futuro
que se concretizou no dia em que recebi o meu diploma de médico. Durante esse
percurso muitos foram os percalços, próprios à vida de um jovem com a planta
dos pés ainda calçadas pelo generoso
patriarcado do chão da minha vetusta cidade de São Bento, onde por sua
localização sub equatorial e baixa altitude tem uma natureza cíclica com as
chuvas que tornam os campos verdes pelas plantas aquáticas, riscados por
estreitos espelhos d’água cheios de vida e encantamento, e com o sol
desimpedido em luz e calor expõe o ventre do mesmo campo em barro renovador da vida que gesta para ser criada
nas águas novas. Tamanha generosidade me faz lucubrar numa perdoável blague, que
se Deus. no seu momento mais artístico, tivesse feito Adão com esse barro, com
certeza a humanidade seria melhor.
Como dizia,
longe de casa, dono do meu próprio nariz aos 14 anos de idade, sentia o ambiente novo desta cidade cheio de portas
que eu tinha que abrir uma todo dia usando como chave o entusiasmo para
alcançar o meu objetivo, a honestidade comigo mesmo cumprindo a missão para a
qual aqui me encontrava e sobretudo ampliando a audição às admoestações de meu
pai e da minha mãe, que à distância entregavam-se ao labor para regar a
esperança e confiança em mim depositadas.
Hoje, é um dia
diferenciado na minha vida. Recebo, neste ofício acadêmico, a permissão para
ostentar, com orgulho que não suplante
a humildade, esta medalha que me laureia e este diploma que me registra como
membro desta virtuosa Academia Maranhense de Medicina e me traz para
congregação com pares tão distintos e
distinguidos que lastreiam o seu Curriculum
vitae de amor pela sabedoria, no âmbito das relações com o conhecimento
cientifico tendo a medicina como foco maior e sua aplicação na preservação da
vida e bem estar.
As Academias
criadas em tempos tão longínquos como escolas, veem aos poucos perdendo essa
finalidade para serem depositárias e
preservadoras de tradições, fatos e produtos da inteligência. Devem as
Academia de Medicina, por sua finalidade, preservarem o médico ou a
medicina? Ou ambos?
Em entrevista ao Jornal do Conselho Regional de
Medicina de São Paulo, em maio de 2013 o Dr. Afonso Renato Meira, Presidente da
Academia de Medicina de São Paulo diz: ”O papel da Academia é preservar
a história e manter a cultura médica por meio das tradições”.
Porém,
ao passar a presidência da Academia Nacional de Medicina para o biênio
2013-2015, ao Dr. Pietro Novellino, que é meu confrade da Academia Brasileira
de Médicos Escritores, o Dr. Marcos
Moraes, em brilhante memorial da sua administração diz: “ Já avançamos, mas
precisamos dialogar mais sobre o papel da Academia no mundo atual, vamos
preservar a memória e tradição da Academia, mas precisamos continuar inovando
neste momento, no qual o governo brasileiro tenta impor uma reforma da
profissão médica e sem uma prévia consulta às Academias, às universidades, aos
profissionais e órgãos de classe. Temos consciência do importante papel da
Academia no aconselhamento das políticas de saúde de nosso país.”
São
opiniões forjadas pela experiência e que se completam e definem que a Academia
é dinâmica e se envolve com o tempo em suas divisões, preservando, orientando e
planejando. A importância de uma Academia de Medicina como esta nossa é o
coletivo de mentes, abundantes em conhecimentos nas mais variadas formas de
desempenho da medicina, portanto apta a ser referenciada e reverenciada,
cheirada e ouvida em assuntos da sua abrangência.
A
vida é de tal forma, muito frágil, portanto há de ser a medicina muito
cuidadosa e os médicos muito responsáveis e fixados no seu compromisso com os seus
semelhantes, conforme fazem em juramento.
A
medicina tem um deus mitológico – Esculápio e os médicos são seus sacerdotes,
os hospitais as suas igrejas e os consultórios as suas ermidas. São locais onde,
com devoção e sacrifício, fazemos as nossas obrigações. A medicina tem, também,
um Deus criador, que nos entrega suas criaturas para cuidado e preservação e
deste somos artesãos restauradores. E pela tarja filosófica que envolve a
medicina somos guardiões do sopro sagrado: a vida.
Portanto,
é uma apostasia deixarmos os apelos materiais cobrir a nossa face, e tornar-se
o nosso propósito, pois isto desmorona todo o sentimento de humanidade ao qual
nos propomos. Se nos distanciamos do nosso ministério perdemos o desejo de
servir e passamos a exigir que nos sirvam, adotando comportamento pretensamente
superior chegando mesmo a escolher paciente pelo seu status quo. Isto , concretizado, é um aviltamento de consciência. O
célebre Maimônides, médico, rabino e teólogo, conhecido como o príncipe dos
médicos, que viveu na idade média, com
seu conceito integral do ser humano e o critério racionalista e amplo da sua
filosofia, com sua obra absolutamente atual e admirada, escreveu uma oração ou
juramento, embasado nos quatro
princípios da bioética principialista, onde em certa parte diz: “Concede-me
força de coração e de mente , para que ambos possam estar prontos a servir
ricos e pobres, os bons e os perversos, amigos e inimigos, e que eu jamais
enxergue num paciente algo além de um irmão que sofre”.
Idiossincrasias
no comportamento profissional do médico enfraquece o conjunto, a classe,
sujeitando-a à exposição pejorativa na mídia mal intencionada, respingando
aleivosia naqueles pautados pelos bons
princípios da medicina. Some-se a isso a abertura da guarda que possibilita a
tomada da nossa obrigação por aventureiros. Não me refiro aos colegas que, por
um motivo seu ou por força de outem, venham para o nosso país. Até merecem
respeito. Refiro-me ao aproveitamento oficial maquiavélico, doloso e astuto
dessa situação de insegurança do trabalho médico no Brasil.
Há
muito a medicina liberal tornou-se muito restrita. Hoje estamos sob a dura e
financeiramente poderosa tirania dos
planos de saúde ou sob a disfarçada e suave pobreza da gestão pública nacional
de saúde. Os concursos públicos para médico são raríssimos e os salários tão
aviltantes, cujos valores, por inferioridade. não tem mais correspondentes nos
poderes legislativo ou judiciário nem em cargos destinados aos, apenas, portadores
do ensino fundamental. O Sistema Único de Saúde retribui o trabalho do médico
com valores irrisórios, vergonhosos, invisíveis. Em maio de 2011, a prefeitura
de um município do interior deste Estado, por um edital de concurso oferecia 01
salário mínimo, à época R$ 545,00 por vinte horas semanais de trabalho médico,
sem a menor parcimônia, dando ideia de como o nosso trabalho é mal avaliado.
Com
a gestão municipal da saúde, o médico passou a ser contratado pelas prefeituras de modo
inusitado: verbalmente, somente com o salário e nenhum outro direito
trabalhista. Não pode se atribuir má fé ao gestor porque é uma relação já
aceita como institucional. Não tem férias, nem décimo terceiro salário e muito
menos aposentadoria? Esse contrato
termina as vezes por um recado ou quando a administração política termina o seu
mandato. Quem quer ou quem pode trabalhar sem segurança? Somente o médico. As
razões sempre tem raízes. Mude-se o sistema e vejamos se haveremos de importar
estrangeiros com suas dificuldades de comunicação verbal e de conhecimento da
nossa realidade e do nosso povo com suas tradições e crenças. Não há previsão
de importação de trabalhadores da justiça, eles trabalham em qualquer lugar
porque são tratados sério pelo Estado.
É
urgente que a classe médica reconheça a sua vulnerabilidade e corra para
alcançar uma unidade requerente de
prerrogativas devidas. Além do mais há que se restaurar a cortesia entre colegas,
hoje tão pouco praticada, concorrendo para um distanciamento enfraquecedor.
Vivemos
uma época extraordinária de evolução da medicina. A propedêutica saiu dos
sentidos dos médicos e passou para os olhos e ouvidos da eletrônica, com a
precisão impressionante dos nuclídeos com suas energias, isomerias e
radioatividade, com a pequenez dos circuitos integrados, com a memória dos
chips, a clareza de imagens digitalizadas ou as moléculas marcadoras, ampliando sem limites a possibilidade de
diagnósticos. Com isso a ciência médica passou a cobrar dos seus operadores, os
médicos, a resolução das patologias tão mais complexas e seguramente
diagnosticadas. Há muito saímos da
medicina intuitiva para termos a obrigação, dentro da nossa área de atuação, de
conhecermos a fisiopatologia e a segurança de aplicar um tratamento com o
conhecimento da atividade da farmacologia. Isso diferencia. E o importante,
justo e honesto é que esse lençol cubra todas as classes sociais e econômicas
com a mesma proteção.
Estarão
os médicos e os centros de pesquisas no caminho certo? Claro. Afere-se pelos
resultados. Cirurgias miraculosas. O impossível sendo desmoralizado nas salas
de cirurgia. A nata da ciência médica se esbaldando em tecnologia e sucesso. Porém,
qualquer estágio de evolução tecnológica não deve inviabilizar a relação
médico-paciente, pois entre estes há sentimentos, emoções e amor. E pelo que se
pode comprovar, essa troca faz parte da terapêutica.
Porém,
há uma porta fechada. A ortodoxia desta nossa medicina ocidental não dá abrigo
a conhecimentos que não estejam vinculados a padrões limitados por suas
exigências protocolares. A prática da medicina não é apanágio de uma determinada civilização, nem se estrutura por
normas regimentais, mas por princípios culturais, filosóficos e históricos.
Além de se admitir a evolução da humanidade e seus conhecimentos. Há uma clara
falta de apoio à medicina mente-corpo, representada
pela Hipnose, embora seja oficialmente reconhecida, no Brasil, como ato médico.
Hoje, estamos pleiteando à Associação Médica Brasileira a sua inclusão como
especialidade.
Hoje
já se reconhece, através de pesquisas armadas que a biologia dos sistemas
orgânicos é sensível e responde a sugestões mentais, crenças e pensamentos.
Está provado, em inúmeros estudos modernos, que mente e corpo formam um sistema
integrado que se influenciam mutuamente. Os avanços são pequenos mas constantes
e o futuro de previsível destaque, contribuindo para o bem estar das pessoas
quando não há fármaco que dê jeito, nas patologias de fundo emocional e até
mesmo orgânicos. Esta foi uma das metas que nasceu em mim tão cedo, junto com a
vontade de ser médico.
Quero,
na liturgia deste ato incluir glorificação a todos aqueles que com a
santificada missão de transmitir conhecimento, contribuíram para a minha
formação profissional – os meus professores, aos quais ofereço como
reconhecimento a erudição destas palavras de Sir Isaac Newton: “ Se vi
mais longe, foi por me haver colocado nos ombros de gigantes “.
Cito
alguns com os quais os assuntos
acadêmicos foram suplantados pela agudez das emoções: Prof. João Bacelar
Portela, Prof. José Ribamar Waquim, Prof. Raimundo de Matos Serrão; Prof.
Francisco Teixeira Leite; Prof. Afonso Amaral; Profª.
Terezinha Abreu, Prof. Ibraim Almeida e o Prof. Quadros. Deste admirava a
elegância da postura e da palavra e a fidalguia no relacionamento pessoal.
Quando eu cumpria os estágios do então 6º ano de medicina, no Hospital
Presidente Dutra, cruzei com o Dr. Quadros em uma das rampas entre os andares e
ele me perguntou se eu já tinha conseguido uma residência médica. Já tinha
conseguido e agradeci, mas ele disse se eu quisesse fazer cardiologia me
conseguiria residência no Hospital do Iaserj no Rio de Janeiro. Posteriormente,
levei-lhe dois colegas que não tinham conseguido residência e colocou ambos
naquele serviço que era chefiado por um amigo seu. Hoje, por obra do destino,
estou aqui para, com muita honra, dignificar a sua memória.
Agradeço,
com muito empenho, aos nobres confrades desta expressiva Academia por haverem
me aceito e meu reconhecimento será a minha dedicação e a minha devoção aos
deveres de acadêmico.
Ponho
minha gratidão a transbordar nas mãos dos amigos que me deram apoio e suporte
para eu poder cumprir este ritual: Sanatiel Pereira, Dona Rosana Santana, aqui
do CRM, Vavá Melo e o Prof. Aymoré.
Agradeço
à minha família, a Régia minha esposa e a meus filhos, pelo constante apoio e
estímulo, além da harmonia em que construímos nossos ambientes.
Um
agradecimento, muito especial, ao Dr. Pádua por receber-me com palavras
elogiosas, montadas no brilhantismo da sua habilidade literária, em tão harmoniosa
oratória.
Desejo
que o brilho desta medalha, que meu coração ostenta, ilumine a memória do Sr.
Manoel Rodrigues Vale e da Dona Zuila Viegas Vale, meus pais.
Muito
obrigado por me ouvirem.
Assinar:
Postagens (Atom)